Hospital João de Almada. O sol abriu de azul o céu quando a Imagem chegou. O mar, lá em baixo, escondia-se, envergonhado, sob um manto de neblina.
Aos poucos, a tarde foi pintando de alegria o jardim do Hospital: talvez fossem as pessoas que se aproximavam do altar; talvez as flores que emprestavam a sua brancura ao Inverno, talvez a azáfama de médicos, de enfermeiros, de pessoal auxiliar, de animadores; talvez a esperança pendurada nos olhos dos doentes que, das varandas, bebiam a novidade.
Ouvi as palmas e vi voar os pombos. Vi os olhos da Senhora pousados na dor de quem está neste hospital, de quem espera aqui que o tempo acabe. Vi as mãos de quem cuida, de quem veio aplacar a solidão que se esconde nos olhos baços, nas pernas paradas, nas mãos que teimam em não mexer. Vi lágrimas mastigadas em litanias incompreensíveis. Vi pés arrastados num caminhar teimoso pelos corredores como se isso lhes adiasse o momento de parar de vez. Do resto, não sei falar.
Quando a procissão subiu ao altar, o silêncio fez parar o tempo. O andor foi transportado pelas mãos que, todos os dias, transportam sofrimentos. Foi então que os meninos do Livramento/ Monte encenaram Fátima. A Primavera veio mostrar ao Inverno a alegria de viver, a inocência branca da meninice, veio trazer um pouco de luz a esta enfermaria ao ar livre.
A Imagem ali, numa nuvem de orquídeas brancas, velando, atenta, ia dizendo ao ouvido de cada doente aquilo que ele precisava de ouvir.
Na Eucaristia, falou-se de esperança e de entrega. Falou-se das Bodas de Cana. Falou-se da coragem de quem acredita. Falou-se de cruz. Falou-se de milagres, de Lourdes e de Fátima. Falou-se de uma Senhora que cura, que protege, que abraça.
Depois, a ternura na tremura das mãos que trouxeram os dons ao altar, o apoio dos cuidadores e de quem vive apenas para segurar quem precisa No altar desta tarde, colocou-se a esperança na ciência, a confiança de que se precisa quando ela falha, simbolicamente representados num terço feito de cápsulas de medicamentos.
Maria ficou. Ao lado do altar do Seu Filho. Nos terços que tremiam nas mãos de quem já não consegue fazê-las parar.
Maria ficou: na bênção dos doentes e no pedido de cura; no sorriso meigo do Senhor Bispo, a abraçar cada um; nas memórias de quem tinha visto a Imagem num tempo em que ainda tinha a vida toda para viver.
Maria ficou. Mesmo quando as visitas se foram embora e as enfermarias se povoaram, outra vez, de sofrimento. Porque é Mãe. Porque o Seu Manto guarda o céu e ajuda os Seus filhos a adormecerem felizes.
Texto - Graça Alves
Fotos – Carlos Cabral
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